segunda-feira, 18 de abril de 2011

Crise econômica derruba Governo português e abre corrida eleitoral

Lisboa, 23 mar (EFE).- A crise econômica que deixa Portugal à beira de um resgate financeiro acabou nesta quarta-feira com seis anos de gestão do Executivo socialista de José Sócrates, que renunciou após a oposição rejeitar seu último plano de austeridade.

O dirigente conservador Pedro Passos Coelho, cuja decisão de não apoiar desta vez o Governo, forçou sua queda, sugeriu imediatamente a realização de eleições antecipadas e se mostrou disposto que seu partido afronte do Governo a crise econômica portuguesa.

No entanto, o líder parlamentar socialista, Francisco Assis, expressou confiança de que Sócrates volte a ser candidato nas prováveis eleições que ainda devem ser convocadas pelo chefe de Estado, Aníbal Cavaco Silva.

O primeiro-ministro demissionário não informou seu futuro quando justificou, em uma declaração ao país, a renúncia que tinha anunciado previamente a chefia do Estado em um breve comunicado em seu site.

O líder socialista explicou a renúncia pela rejeição da oposição ao plano econômico apresentado nesta semana para tentar superar a crise econômica e evitar pedir ajuda externa.

Sócrates acusou as forças da oposição de antepor o interesse partidário aos interesses nacionais e os responsabilizou pelos problemas que Portugal possa sofrer.

Em seu comunicado, a chefia do Estado anunciou que o presidente, o conservador Aníbal Cavaco Silva, fará reuniões com os partidos políticos na próxima sexta-feira e que, enquanto isso, o atual Executivo se mantém como interino até a aceitação da renúncia.

Passos Coelho, presidente do Partido Social Democrata (PSD, centro-direita) do qual Cavaco é líder, responsabilizou o primeiro-ministro demissionário, José Sócrates, de "não conseguir criar confiança" nos mercados e castigar os portugueses com sucessivos planos de austeridade que não deram resultado.

O líder da oposição fez outra declaração pública na qual esboçou o plano de seu partido para combater a crise e considerou a mudança de Governo "um caminho normal na democracia".

Em referência às eleições antecipadas - que devem ser realizadas dentro de dois meses -, Passos Coelho considerou que este processo "permitirá ao país escolher um novo Governo com mais confiança, mais força".

Sem citar o processo eleitoral, que já se dá por inevitável há menos de um ano e meio depois das eleições nas quais os socialistas perderam a maioria absoluta, o dirigente parlamentar proclamou nesta quarta-feira que Sócrates "é e seguirá sendo" seu líder.

O primeiro-ministro demissionário se mostrou muito crítico com os partidos de oposição ao explicar sua renúncia e os acusou de "obstruir" a ação do Governo, "menosprezar" os avanços conseguidos com a União Europeia e atuar com "irresponsabilidade" e "oportunismo.

"Hoje o país perdeu, não ganhou", resumiu o dirigente socialista, que também lembrou que sua renúncia chega em um momento "crucial" para Portugal e para a Europa, devido à cúpula extraordinária realizada na quinta-feira em Bruxelas na qual serão discutidos os mecanismos de gestão da crise da dívida.

O dirigente socialista afirmou que a crise política aberta nesta quarta-feira "só pode ser resolvida pela decisão soberana dos portugueses", em referência à convocação de eleições, e deixou entrever sua disposição a se candidatar novamente.

"Com a determinação de sempre e a mesma vontade de servir meu país, me submeterei a essa decisão", ressaltou.

"Há vários meses, lutei com o propósito fundamental de proteger o país da necessidade de recorrer à ajuda externa, para não cair na mesma situação que Grécia e Irlanda", ressaltou Sócrates ao lembrar as "consequências profundamente negativas" de uma intervenção para "a imagem e o prestígio" nacional.

Sempre Abril

MFA - Propaganda

MFA - Continuando a luta

Mini-Guia MFA - Cerco do Quartel do Carmo

entrevista Salgueiro Maia

Abril de Novo -25 de Abril Sempre !

Capa do Filme

Fado Tropical - Chico Buarque

Chico Buarque Tanto Mar Revolução dos Cravos

Capitães de Abril: Utopia e Revolução

Antes de mais nada, tenha o leitor em conta de que Capitães de Abril narra uma história de amor. Nada mais estranho, dirão alguns, pois não há Revolução que se levante sem uma grande declaração de amor ao seu país, ao seu povo e, sobretudo, à liberdade. E, não fosse tudo isso, falamos certamente do dia mais importante da trajetória do Portugal moderno.

Entretanto, o filme de Maria de Medeiros pode ser melhor compreendido se cotejado com um outro: Bom povo português, exibido em São Paulo, pela TV Cultura, há alguns anos. Ambos propõem uma memória da revolução dos cravos. O primeiro, preso ao dia 25 de abril, revela a generosidade dos oficiais que derrubaram uma ditadura de quase meio século. Não é por outro motivo que seu herói é o capitão Salgueiro Maia (aquele que não quis o poder). O outro, à moda dos documentários russos dos anos 20 e 30, subverte o seu próprio gênero, dando um tom cômico aos personagens, distorcendo a realidade aparente para revelar a subjacente. Afinal, como dizia o velho Marx, se essência e aparência fossem idênticas toda a ciência seria supérflua.

Bom povo português não se fixa num dia, mas num processo. No fim, vemos outro herói do 25 de abril, o major Otelo Saraiva de Carvalho, assistindo ao poder que sonhara distribuir ao povo voltar às mãos dos profissionais. Não por acaso, este filme foi praticamente banido de Portugal. Seu herói é o povo português, indiferente quase aos acontecimentos da superfície política na sua eterna e recorrente vida cotidiana. É no mínimo incômodo mostrar o rosto de Otelo, este anti-herói que arriscou tudo pela revolução e, anos depois, foi condenado a 15 anos de prisão... Talvez não menos incômodo seria o filme de Maria de Medeiros se os expectadores soubessem das perseguições sofridas pelo Capitão Maia depois de abril... A historiografia (e talvez eles mesmos) preferiria vê-los como pólos antagônicos.

O filme de Maria de Medeiros, embora não fale diretamente de Otelo (que estava, com outros oficiais, no posto de comando da Pontinha, controlando todas as ações do 25 de abril com o codinome Óscar) mostra o que os une. Fala do que ligou todos os capitães: não a política, mas o sentimento. Sua história procura ser fiel aos acontecimentos. Desde o momento em que os chaimites param no sinal vermelho (pois a revolução respeitou as leis!) até o momento em que dois capitães são confundidos com pides (agentes da antiga polícia salazarista), embora essa história realmente tenha acontecido com Otelo e não com Maia...


Mas não deixa de ter o olhar particular da autora, como ela mesma o confessa, no filme, através da menina que declara seu eterno amor ao herói Salgueiro Maia. E da mulher que, na condição de diretora, apostou nas palavras de ordem das mulheres portuguesas, estas já tão mitigadas após décadas de repressão. Não estamos, por certo, muito distantes do Maio de 68, de modo que a Paris da possibilidade, a Eutópia dos reprimidos, já era anunciada logo no primeiro diálogo do filme, na noite anterior à Revolução. Momento emblemático deste dia, viria a ser o flagrante deste mesmo casal, ao ser surpreendido fazendo amor dentro de um chaimite. Talvez a imagem mais próxima para a explosão revolucionária registrada por Maria de Medeiros tenha sido a resposta de Goethe à revolução de julho de 1830, na França: "O vulcão explodiu, tudo está ardendo, não haverá mais negociações".

E este é um grande evento de uma outra história "ficcional" que encontramos no filme. A da guerra que uniu e desuniu um homem e uma mulher. Encanta e deixa um sentimento de perda. Mas ela serve para falar de outro sentimento: a revolução por si só foi um ato de amor numa sociedade que reproduz a solidão. Foi a busca de valores autênticos onde eles não existem. Mas de fato eles existiram por alguns meses em Portugal. Talvez, como diz o herói do filme, apenas para que os inimigos se tornassem menos visíveis. 


Lincoln Secco é doutorando em História Social pela FFLCH-USP 
Marisa M. Deaecto é doutoranda em História Econômica pela FFLCH-USP

36 anos da Revolução dos Cravos

Portugal, os fuzis e os cravos

No dia 25 de abril de 1974, devido a um golpe militar incruento, Portugal deixou de ficar isolado do mundo. Até então era governado por um dos regimes mais arcaicos da Europa – o do salazarismo. O que fez com que fosse apelidado de “A Albânia do Atlântico”. Um sistema autoritário, fascista e colonialista, que já durava 48 anos, foi derrubado em apenas 17 horas devido a decisão e à tenacidade de um punhado de oficiais, quase todos capitães do exército. Assim, democratizando-se, Portugal iniciava o seu caminho de volta para ser reintegrado ao concerto das demais nações européias. 


“Grândola, vila morena”


"Valeu a pena? Tudo vale a pena se alma não é pequena."
Fernando Pessoa, Mensagem, 1934.
 
 Na madrugada de 6 de junho de 1944 os integrantes da resistência francesa, com o ouvido colado nos rádios, estavam todos em alerta. A primeira parte da mensagem vinda de Londres já chegara: um trecho de um poema de Paul Verlaine que dizia, “Os longos lamentos dos violinos do outono”. Aguardam, ansiosos, a segunda parte. E, umas horas depois, ela veio: “ tocam no meu coração com monótono langor”. Então desabou um dilúvio. Era o Dia-D. Num céu coberto por aviões de todos os tipos, milhares de navios transportando mais de 200 mil homens das tropas aliadas desembarcaram naquela manhã nas praias da Normandia para por fim ao nazismo que então dominava boa parte da Europa.
Trinta anos depois do Dia-D, começo da libertação final da Europa, nas margens do mesmo Oceano Atlântico, somente que mais ao sul, quando ele banha Portugal, também os resistentes antifascistas aguardavam uma mensagem em código. Eram os integrantes do MFA (Movimento das Forças Armadas), composto por jovens capitães do exército português quem estavam em alerta. Às 0,20 h. do dia 25 de abril de 1974, a Rádio Renascença colocou no ar a música de Zeca Afonso “Grândola, vila morena”, cujas letras falavam em fraternidade, igualdade, e dum estranho lugar onde “O povo é quem mais ordena”.
Os regimentos aquartelados nos arredores de Lisboa, em estado de prontidão, sabiam do se tratava. Do seu QG no Quartel da Pontinha, o major Otelo Saraiva, um protegido do general Spinola, deu então a ordem para que eles se movessem. Comandando a EPC (um regimento de cavalaria de Santarém), o capitão Salgueiro Maia entrou com sua coluna na capital ainda às escuras, estranhando muito aquele silêncio.
Quando o dia amanheceu ele já ocupara o Terreiro do Paço sem fazer um só disparo. Os lisboetas, estupefatos, começaram a se aproximar dos tanques e dos caminhões. Não sabiam bem do que se tratava. Viram que as armas não apontavam contra eles mas sim contra os prédios do arcaico regime. A euforia da multidão então começou.
A revolução dos cravos
Quando as vendedoras de flores chegaram ao Rossio, o gesto delas foi espontâneo: enfiavam cravos vermelhos na ponta dos fuzis. Que diabos de revolução era aquela? Não se ouviam canhonadas nem gritos de dor. O povo, endoidecido pela súbita lufada de liberdade, subia nos tanques e se abraça nos soldados. Mulheres, crianças, velhos, todo mundo saiu de casa para celebrar aquele acontecimento extraordinário. A Lisboa dos tristes fados, naquele dia tornou-se a cidade mais alegre de toda a Europa. Marcelo Caetano, presidente do Conselho de Ministros, o herdeiro político do ditador Oliveira Salazar, refugiou-se no Quartel do Carmo, onde os carros de assalto de Salgueiro Maia o cercaram. Enquanto isso os espiões da PIDE (Polícia internacional de defesa do estado) resistiam a tiros do alto do seu QG na rua Antonio Maria Cardoso, até que fossem rendidos no dia seguinte.
Ao longo daquela quinta-feira chuvosa, todas as cidades importantes de Portugal, fosse Évora, Coimbra ou o Porto, caíram no controle dos militares rebelados. O Estado Novo, regime dos mais retrógrados da Europa, sustentado há quase meio século pela roça e pelo confessionário, ruíra com uma facilidade impressionante. Esfumou-se em apenas 17 horas pela firme decisão de um punhado de oficiais decididos a implantar uma democracia em Portugal.
Ninguém mais tolerava as guerras africanas (1961-1974), purgatório para onde a maior parte da juventude lusitana era enviada à lutar por dois anos. Combate sem fim e desesperançado, que já havia provocado mais de 8 mil mortos e 15 mil feridos , a inútil tentativa de uma vontade reacionária em querer manter um império ultramarino quando o colonialismo já caducara.
Pareceu mais lógico à gente do MFA que o caminho mais curto para terminar o morticínio nas colônias era por abaixo o governo burro, cego e surdo. Ficou claro para eles que a batalha final devia ser travada nas ruas de Lisboa e não nas selvas da Guiné, de Angola ou Moçambique, nas “areias morenas da Africa” como dizia Fernando Pessoa. E assim o fizeram, sem recorrer à fuziladas e matanças. O projeto deles era simples: democracia, descolonização e desenvolvimento. Arrancar Portugal do isolamento e, satisfazendo o antigo sonho de Antero de Quental, reintegrá-lo na Europa. Cumpriu-se o programa. Curioso, o fascismo foi varrido da Europa inspirado em estrofes de poetas.

Revolucao dos Cravos - Grandola, Vila Morena - 2011